Já terá certamente ouvido alguém questionar-se sobre o verdadeiro valor de uma formação superior quando muitos diplomados têm sucesso em áreas distintas daquelas em que se diplomaram. Numa altura em que existem cada vez melhores cursos de formação disponíveis online e redes sociais que interligam pessoas com interesses comuns, qual é o verdadeiro valor da Universidade? A resposta é, na minha opinião, a relação entre o professor e o aluno e a capacidade que o primeiro tem de desafiar o segundo e de o acompanhar ao longo do processo de aprendizagem enquanto procura soluções para esses desafios.

A escolha dos desafios não é um processo fácil, pois estes têm que se adequar às capacidades dos alunos e aos objetivos de aprendizagem, têm de resultar numa avaliação e deverão ser suficientemente motivadores para manter o interesse dos alunos durante as dificuldades que irão enfrentar. Na maioria dos casos, os problemas são concebidos pelos próprios professores, por vezes inspirados em problemas reais, mas suficientemente simplificados de forma a poderem ter todos os dados necessários para uma solução ótima que será usada como referência para a avaliação dos alunos. O principal inconveniente deste tipo de desafios é a menor motivação dos alunos em procurar uma solução que o professor já conhece e o desincentivo à colaboração com os colegas que competem na resolução do mesmo problema. O que seria interessante era conseguir juntar o processo de aprendizagem com a solução de problemas do mundo real. Mas como fazê-lo?

No caso do ensino da engenharia, a evolução tecnológica tem conduzido a um movimento de mudança nas grandes instituições de ensino superior. A digitalização da economia tem tido um grande impacto na prática de engenharia, generalizando metodologias ágeis de desenvolvimento de produto com ciclos extremamente curtos, de forma a dar resposta à rapidez de mudança dos mercados. Isto tem conduzido os empregadores a procurem diplomados com mais do que conhecimentos sólidos e atuais: os engenheiros têm de ser inovadores, auto-motivados, habituados a trabalhar em ambientes com diversidade, capazes de encontrar soluções criativas para problemas mal formulados em contextos de elevada incerteza.

As escolas de engenharia precisam de encontrar formas de acrescentar a uma formação técnica, a possibilidade de aplicação dessas competências em soluções para problemas tal como eles surgem no mundo real, por forma a desenvolver nos alunos uma mentalidade inovadora. É, neste contexto, que têm sido criadas unidades orgânicas dedicadas à promoção do empreendedorismo e da inovação, como interfaces entre o ambiente académico de aprendizagem e investigação e o ecossistema de inovação externo à Universidade, incluindo empresas, organizações governamentais e não-governamentais, investidores, etc. No caso do Técnico esta unidade tem o nome de iStartLab, começando com as letras IST inscritas no escudo que é o logotipo da escola.

Tal como em instituições congéneres, o iStartLab oferece aos alunos espaço para se reunirem em atividades de aprendizagem e cocriação, bem como espaço e equipamentos para a construção dos seus protótipos. O principal objetivo do iStartLab é levar os alunos à ação, aplicando os seus novos conhecimentos e evitando o excesso de planeamento. Numa crónica anterior (“Tem uma Mentalidade Inovadora?”, 7-jan-2019) referi que a mentalidade inovadora se pode decompor em 7 dimensões: a confiança nos outros, a resiliência, a diversidade, a autoconfiança, a capacidade de colaborar, a sensibilização para os recursos e a capacidade de lidar com a incerteza. Estas características treinam-se quando desafiamos os alunos a trabalhar em grupo na criação de soluções para problemas do mundo real.

Para cumprir o seu objetivo, o iStartLab desenvolverá o processo de encontrar desafios adequados aos alunos. É preciso assegurar que o desafio tenha o grau de complexidade adequado, seja suficientemente genérico, possa conduzir a resultados no prazo fixado, cumpra os objetivos de aprendizagem, que exista financiamento para os custos de desenvolvimento dos protótipos e o compromisso de disponibilidade de um “dono” do problema para trabalhar com os alunos. Este último requisito é essencial para possibilitar a geração de soluções criativas mas limitando-as às que sejam realizáveis. Deve-se evitar que o “dono” do problema traga a solução consigo: o objetivo é o de fazer os alunos criar uma solução e não o de implementarem uma solução que lhes é imposta.

O problema de procurar desafios para serem usados por alunos em processos de aprendizagem pode parecer simples mas a conjugação dos requisitos referidos tornam a tarefa difícil. O esforço que a equipa de inovação do iStarLab precisa para a avaliação e adequação das propostas de desafios, é mais uma confirmação do princípio de que devemos gastar mais tempo a definir o problema do que a procurar a solução. Se tem um desafio para nos propor, visite-nos em istartlab.tecnico.ulisboa.pt.

Adaptado da minha crónica no Jornal i de 28 de janeiro de 2020