Na semana passada recebemos no Técnico equipas de 3 projetos em fase de prova-de-conceito no âmbito do projeto Erasmus+ IF4TM. Este projeto tem como objetivo criar um enquadramento para o desenvolvimento da Terceira Missão das universidades na Sérvia e inclui 17 parceiros: 12 instituições da Sérvia e 5 universidades da União Europeia.

A ideia de que as universidades têm uma Terceira Missão para além do ensino e da investigação é recente. Normalmente, aponta-se a sua origem na década de oitenta do século passado, associada à publicação nos EUA da lei Bayh-Dole Act em 1980. Esta lei transferiu para  as universidades os direitos de propriedade intelectual resultantes de projetos financiados pelo governo federal. O aumento do portfólio de patentes levou à criação de gabinetes de transferência de tecnologia com a missão de procurar interessados em explorar essas invenções. Na falta de empresas interessadas os próprios inventores criaram empresas para esse fim, sendo a Google é um exemplo. Através deste processo, o conhecimento criado nas universidades é usado em produtos que vão beneficiar toda a sociedade.

De uma forma mais ampla, a Terceira Missão da universidade engloba as atividades de ligação à Sociedade que se dividem em 3 áreas. A primeira é a já referida transferência do conhecimento. A segunda visa dar resposta à cada vez mais rápida evolução tecnológica que cria necessidade recorrente de formação ao longo da vida. A última área é a do impacto socioeconómico, tendo a universidade um papel no desenvolvimento económico da região onde se insere, dinamizando a atividade económica e atraindo talento.

O título desta crónica inspira-se no artigo “Mission Impossible? Entrepreneurial Universities and Peripheral Regional Innovation Systems” de Ross Brown (2016), que analisa o caso da Escócia e no baixo retorno dos investimentos públicos na comercialização dos resultados da investigação. Estas atividades não parecem ter o impacto regional que se esperava e, apesar da criação de novas empresas de origem universitária, estas tendem a manter-se pequenas ou a serem compradas demasiado cedo. Além disso, as pequenas e médias empresas regionais têm dificuldade em converter em produtos ou serviços as tecnologias de ponta desenvolvidas nos centros de investigação universitários.

Porquê criar, então, um quadro de desenvolvimento da Terceira Missão para as universidades da Sérvia? A principal razão é a de que existe um número muito considerável de benefícios económicos nos canais informais que se estabelecem neste âmbito. Um dos mais importantes é o contributo da maior ligação dos professores e investigadores ao tecido económico na preparação dos alunos para as necessidades do mercado. Mesmo que as empresas não possam ser o veículo de valorização dos resultados da investigação, podem beneficiar da consultoria e conhecimento dos académicos e da sua capacidade de formar talentos. As universidades permitem também manter uma rede de talentos que podem transitar entre os centros de investigação, as empresas existentes e com potencial para criar novas empresas. Um bom exemplo é o da Universidade de Cambridge que nos anos 80 nos deu o ZX Spectrum da Sinclair Research e que desde então se mantém com um ecossistema de inovação único na Europa.

A visita ao Técnico das equipas de professores de universidades da Sérvia teve como objetivo elevar o nível de prontidão das suas tecnologias, do modelo de laboratório para um protótipo industrial. Tendo as tecnologias uma vasta gama de aplicações, é necessária uma escolha criteriosa do mercado inicial para maximizar as hipóteses de sucesso. O primeiro passo é o de identificar todo o potencial da tecnologia. Para isso colocámos as equipas em contacto com especialistas do Técnico para identificarem as principais vantagens competitivas. O segundo passo é o mapeamento das patentes já existentes. Treinámos as equipas no uso de ferramentas como o espacenet  (https://worldwide.espacenet.com/) que permitem encontrar todas as patentes relacionadas com certas palavras-chave, a sua aplicação industrial, as empresas que as detêm e a data do pedido. Com esta informação é possível conhecer a concorrência e ter uma ideia do potencial económico da tecnologia. O terceiro passo é perceber que produtos ou serviços podem ser criados com a tecnologia para resolver problemas de potenciais clientes. Para isso treinamos as equipas na metodologia de “Value Proposition Design” de Alex Osterwalder (https://strategyzer.com/books/value-proposition-design): conhecer os clientes e a forma como o produto ou serviço pode reduzir as suas dores e aumentar os seus ganhos.

A missão de valorizar o conhecimento criado nas universidades através dos gabinetes de transferência de tecnologia, parece de facto uma missão impossível. Pensamos que esta abordagem de envolver professores, investigadores e alunos será uma forma de a tornar uma missão possível.

Luís Caldas de Oliveira, @LuisCaldasO

Adaptado do meu artigo no Jornal i de 31 de julho de 2018