Passadas duas semanas sobre a Web Summit, o leitor já deve estar quase recuperado do bombardeamento mediático onde a palavra startup apareceu, pelo menos, uma vez em cada duas frases. Está, por isso, na altura de lhe perguntar, tal como faço aos alunos na primeira aula de Empreendedorismo, o que é para si uma startup e quando é que uma empresa deixa de ser uma startup. Se a sua resposta for que uma startup é uma pequena empresa, geralmente inovadora e ligada à tecnologia, com poucos anos de vida, sugiro que leia este artigo até ao final.

Poucos foram os órgãos de comunicação social portugueses que incluíram Steve Blank como um dos oradores a não perder na edição deste ano da Web Summit, mas são dele alguns dos contributos que estão na origem do método que aumenta a taxa de sucesso de novas iniciativas empresariais e que tem levado a que os cidadãos possam usufruir mais depressa dos progressos tecnológicos.

Steve Blank é um empreendedor que, depois de passar 21 anos a criar empresas tecnológicas, quatro delas cotadas em bolsa, resolveu refletir sobre o processo da sua criação, reunindo em 2005 as suas conclusões no livro “The Four Steps to the Epiphany”. Nele explica a falácia da principal ferramenta de avaliação de novas iniciativas empresariais: o plano de negócios. As previsões neles contidas de proveitos, lucros e cash flow raramente sobrevivem ao primeiro contacto com os clientes. Este livro deu início ao que se chama hoje método “Lean Startup”.

O “Lean Startup” assenta em três princípios. O primeiro é a tela de modelo de negócio, resultado da tese de doutoramento de Alexander Osterwalder, que consiste num diagrama de nove blocos em que cada um contém as hipóteses subjacentes ao modelo de negócio. O livro que escreveu em 2010 com Yves Pigneur encontra-se nas prateleiras de todas as entidades que fazem inovação. O segundo princípio é o do desenvolvimento de clientes (ou com os clientes) que estipula que os criadores de um novo produto e do seu modelo de negócio devem sair do seu edifício para falar com potenciais utilizadores, clientes ou parceiros para validar todas as suas características. Este contributo de Steve Blank era já referido no livro de 2005, mas foi desenvolvido em 2012 em “The Startup Owner’s Manual”, escrito em parceria com Bob Dorf. O último princípio é o da utilização do desenvolvimento ágil, onde o produto é desenvolvido em iterações circulares e incrementais, por oposição ao modelo em cascata, linear e unidirecional. Em cada ciclo formula-se uma hipótese, define-se uma experiência, medem-se os resultados e, em função deles, define-se o ciclo seguinte. Este princípio é o contributo de Eric Ries, fundador de uma empresa em que Steve Blank investiu e que foi o criador do nome “The Lean Startup”, o título do seu livro de 2011.

A metodologia “Lean Startup” tem a enorme vantagem de reduzir os riscos do investimento com uma permanente validação do produto e do seu modelo de negócio, conduzindo à sua alteração ou abandono sem que as perdas de capital assumam valores demasiado elevados. Este método está também a ser cada vez mais usado fora do mundo das start-ups. Projetos de inovação em empresas, novos produtos para a defesa e novas aplicações para os resultados da investigação são alguns exemplos em que este método foca a atenção nos aspetos de maior valor para o cliente final, em benefício do custo e da rapidez de desenvolvimento.

Do meu ponto de vista, uma vantagem adicional do método “Lean Startup” é a sua semelhança com o método científico na formulação, ensaio e validação de hipóteses. Se no Técnico conseguimos treinar muitos cientistas, também conseguiremos treinar mais empreendedores.

Um outro contributo de Steve Blank foi o de ter sido o primeiro a afirmar que uma startup não é uma pequena versão de uma grande empresa. Uma startup é uma organização que tem como objetivo encontrar um modelo de negócio repetível e escalável, enquanto uma empresa executa um modelo de negócio. Foram ideias como esta que, há duas semanas, atraíram, durante 30 minutos, uma pequena multidão ao espaço “Startup University” na Web Summit.

Publicado no Jornal i em 21-nov-2017